domingo, 23 de setembro de 2012

A consciência do “Eu” e a fase da “birra”

O momento da primeira recordação situa-se na evolução normal, no terceiro ano de vida. Antes disso a criança já teve muitas vivências: falou, reagiu, fez muitas coisas que revelaram sua própria vida anímica. Contudo, ela não tinha consciência de seu próprio eu. O momento em que esta consciência desperta é perceptível exteriormente. Até então a criança tinha designava a si própria por seu nome. Chamava-se “Joãozinho” ou “Pedrinho” da mesma maneira como havia aprendido a designar também outras pessoas ou objetos. Isso evidenciava que ela ainda não fazia distinção entre si e os outros conteúdos ou objetos.  Depois, porém, a consciência do próprio eu despertou como algo diferente de todas as outras coisas do mundo.
A criança começa a realizar a SEPARAÇÃO ENTRE O MUNDO E O EU. De repente a criança surpreende as pessoas ao seu redor dizendo “Eu também geléia”, enquanto um dia antes ainda dizia “Joãozinho também geléia”.
            O momento da primeira pronúncia do “eu” é um marco na evolução da criança. É também até essa época que remonta a primeira recordação de fatos relacionados com o eu.
            Juntamente com o despertar da consciência do eu, que é uma separação entre o eu e o resto do mundo, surge também a TENDÊNCIA A DIZER “NÃO” frente ao mundo exterior. A consciência do eu desenvolve-se, nessa época, opondo-se a ele. É o momento em que o homem é capaz de dizer “não”. A fase do “não”, que aparece por volta do terceiro aniversário é também chamada “a idade da birra”, durando geralmente por alguns meses. Em seguida, tendo-se firmado suficientemente, o eu se experimenta a si próprio mesmo quando não precisa opor-se ao mundo. É engraçado ouvir um pequeno retrucar “Eu não quero ir para a cama”, ou “Eu não quero fazer pipi”, gritando enquanto aperta desesperadamente as pernas.
            A idade da birra faz despertar o educador, que precisa conseguir, com muita paciência e tato, que os pequenos atos do dia-a-dia sejam cumpridos sem provocar desnecessariamente a oposição da criança. Aqui só é de ajuda desviar a atenção do objeto de resistência. O adulto deveria impor sua vontade apenas em caso de absoluta necessidade, sabendo suportar este período com paciência, pois é passageiro e, alegrando-se com esse despertar na criança.
            A consciência do eu se exercita pela oposição ao mundo ambiente. O adulto se opõe ao mundo formando seu próprio julgamento; à criança só resta dizer “Não quero”.
            No decorrer dos anos que seguem à idade da birra, a consciência do eu continua de duas maneiras. Primeiro se torna paulatinamente continua; em seguida se desloca uma ação contra o mundo para uma formação de juízo interior sobre ele. Esses processos realizam-se até os seis anos, ao ponto de permitir à criança ir para a escola. Aí a continuidade da consciência do eu é uma premissa para o aprendizado, onde também começa a desenvolver-se o juízo.

Fonte: Desvendando o Crescimento – As Fases Evolutivas da Infância e da Adolescência – Bernard Lievegoed

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