As Festas do Ano


As festas anuais representam uma intensificação dos ritmos diários e, ao mesmo tempo, um intervalo, uma inspiração profunda depois do corre corre diário. Quanto mais nos ligam a natureza, aprofundando nossa vivência nos mistérios da vida, mais nos darão força e vitalidade e mais harmonia haverá no dia-a-dia da vida familiar, ambiente social.
 
Páscoa

A Páscoa é uma festa universal onde os homens, independente de credo e origem comemoram o renascimento da vida através da morte e ressurreição de Cristo. É uma oportunidade de profunda reflexão sobre o que pode ser mudado internamente, transformado.
Para as crianças, a Páscoa é festa de vida natural que desabrocha e floresce. Existem muitas maneiras de dar a eles o presente da vivência da Páscoa como parte do ritmo anual.
Buscar ovos e decorar a casa com flores produz nelas um estado de alegre felicidade. A busca é algo inerente ao ser humano, e sempre vem acompanhada de crescimento e transformação; a imagem da transformação da lagarta em borboleta é bastante significativa (e dispensa explicações aos pequenos, pois as imagens são por eles acolhidas internamente); pode-se fazer um pão especial no dia anterior ao domingo de Páscoa; o trigo é um dos símbolos desta festa, já que, até chegar até nós passou por grandes transformações.

O Coelho de Páscoa
(Conto russo recontado por Christa Glass)

         Era uma vez um pai coelho de Páscoa e uma mãe coelha de Páscoa que tinha sete filhos. Ao aproximar a época da Páscoa eles resolveram testar os coelhinhos para ver qual deles era o verdadeiro “Coelho da Páscoa”.

         A mãe pegou uma cesta com sete ovos e pediu para que cada filho escolhesse um para esconder.

         O mais velho pegou o ovo dourado e saiu correndo por campos e montes até chegar ao portão da escola, mas deu então um salto tão grande e tão apressado que caiu de mau jeito quebrando o ovo. Esse não era o verdadeiro Coelho da Páscoa.

         O segundo escolheu o ovo prateado e pôs-se a caminho. Ao passar pelos campos encontrou a raposa. Esta queria comer o ovo e pediu-o ao coelho. Ele não quis dar. A raposa prometeu-lhe então uma moeda de ouro, conseguindo assim que o coelho a seguisse até sua toca. Chegando lá, a raposa escondeu o ovo e, com cara feia, mostrou os dentes como se quisesse comer o assustado coelhinho que saiu correndo o mais que pôde. Esse também não era o verdadeiro Coelho da Páscoa.

         O terceiro escolheu o ovo vermelho e pôs-se a caminho. Ao atravessar o campo encontrou-se outro coelho e pensou. “Ainda tenho muito tempo. Vou lutar um pouco com ele”. Os dois coelhos lutaram e rolaram tanto pelo chão que amassaram o ovo. Também esse não era o verdadeiro Coelho de Páscoa.

         O quarto pegou o ovo verde e pôs-se a caminho. Quando passava pela floresta ouviu o chamado da pega[1] que, pousada no galho de uma árvore, gritava: “Cuidado! A raposa vem vindo!. O coelho assustado olhou à sua volta procurando um lugar para esconder o ovo. – “Dá-me o ovo que eu o esconderei em meu ninho”, disse a pega. O coelho deu-lhe o ovo mas, percebendo que não havia raposa alguma quis o ovo de volta. A pega respondeu maldosamente: “O ovo está muito bem guardado no meu ninho. Vem buscá-lo se quiseres”. Esse também não era o verdadeiro Coelho de Páscoa.

         O próximo escolheu o ovo cinzento. Quando andando pelo caminho chegou a um riacho. Ao passar pela ponte viu-se espelhado nas águas. Ficou tão encantado com suja própria imagem que se descuidou do ovo indo este se espatifar numa pedra. Esse também não era o Coelho de Páscoa.

         O outro coelho escolheu o ovo de chocolate e pôs-se a caminho. Encontrou-se com o esquilo que lhe pediu para dar uma lambida no ovo. – “mas este ovo é para as crianças”, disse o coelho.

         O esquilo insistiu tanto que o coelho deixou que ele desse uma lambida no ovo. O esquilo achou-o tão gostoso que o coelhinho resolveu dar também uma lambidinha. Lambida vai, lambida vem, os dois acabaram comendo o ovo. Esse também não era o Coelho de Páscoa.

         Chegou então a vez do mais jovem. Ele escolheu o ovo azul. Quando passou pelo campo, veio-lhe ao encontro a raposa, mas o coelho não entrou na conversa dela e continuou seu caminho. Mais adiante encontrou o outro coelhinho que queria lutar com ele, mas ele não parou. Continuou caminhando até chegar à floresta. Ouviu os gritos da pega – “Cuidado! A raposa vem vindo!”. O coelho não se deixou enganar e continuou seu caminho. Chegou então ao riacho e cuidadosamente atravessou a ponte sem olhar para sua imagem refletida na água. Encontrou-se mais adiante com o esquilo, mas não lhe permitiu lamber o ovo, pois este era para as crianças.

         Chegou assim até o portão da escola. Deu um salto nem curto nem longo demais, chegando ao outro lado sem danificar o ovo. Procurou um esconderijo adequado no jardim da escola onde guardou cuidadosamente o ovo. Esse era o verdadeiro “Coelho da Páscoa”!



[1] Ave que vive na Europa e que leva objetos cintilantes para seu ninho.


 
São João Batista e a Festa da Lanterna

Chegou o inverno! Através das festas do ano, as crianças vivenciam o grande ritmo das estações. é uma maneira de  nós, adultos, recebermos, acolhermos estas crianças que querem se situar no mundo. Preciosos valores são semeados no interior de cada uma delas de maneira inconsciente, simbólica, sem conceitos.  
Da Páscoa até São João vivemos um período rico para a meditação e a introspeção.  O friozinho bom nos convida ao recolhimento.

São João foi aquele que viveu no deserto e preparou o caminho para a chegada de Cristo, aquele que batizou com o fogo do Espirito Santo e preparou toda a humanidade para uma nova consciência. Com a chegada de junho e a festa de São João nos revestimos desta chama que permite a cada ser humano encontrar no próximo a humanidade que permeia a todos nós, independente de raça, povo, cor ou crença.

Nas escolas Waldorf vivenciamos a história da menina da lanterna, que busca sua luz interior.

Todos nós passamos por momentos difíceis na vida, momentos em que nos sentimos desorientados e sem rumo. Este momento é simbolizado na história quando a menina que tem a luz de sua lanterna apagada e por conseqüência precisa iniciar um caminho de auto-desenvolvimento para reencontrá-la.

Em princípio ela encontra os animais que representam nossos instintos básicos e que precisam ser domados. Todos eles se negam ajudá-la nesse momento e ela adormece para o sonho. Nesse sonho recebe ajuda das estrelas e indicam um caminho a seguir.

Posteriormente, ela se depara com as três partes que formam o homem: o pensar, o querer, o sentir; representados respectivamente pela fiandeira que tece o fio do pensamento, o sapateiro que com sua vontade e ação faz sapatos que nos mantém com os pés no chão, e a criança da bola que experimenta o mundo com os seus sentimentos.

A menina da lanterna pede ajuda para a fiandeira, para o sapateiro e para a criança da bola, mas está também é negada. A menina desanimada desiste, se entrega e adormece para um sono profundo.

Ao despertar para o mundo físico ela encontra sua luz, trazida pelo sol. Na volta ilumina o caminho daqueles que precisam, num gesto de doação e amadurecimento do seu sentir, querer e pensar. Ao reencontrar os animais e ajudá-los, também está reconhecendo seus instintos e dominando seu mundo interior.
História: A Menina da Lanterna
 Era uma vez uma menina, que alegremente carregava a sua lanterna pelas ruas. De repente, chegou o vento, que com grande ímpeto apagou a lanterna da menina. -Ah! Exclamou a menina – Quem poderá reacender a minha lanterna? Olhou para todos os lados, mas não achou ninguém.

Apareceu, então, um animal muito estranho, com espinhos nas costas, de olhos vivos, que corria e se escondia muito ligeiro pelas pedras – Era um ouriço - Querido ouriço! Exclamou a menina – O vento apagou a minha luz. Será que você não sabe quem poderia acender a minha lanterna?
O ouriço disse a ela que não sabia e que perguntasse a outro, pois precisava ir para casa cuidar dos filhos.

A menina continuou caminhando e encontrou-se com um urso, em lenta caminhada, com uma cabeça enorme e um corpo pesado, desajeitado, grunhindo e resmungando. - Querido urso! – falou a menina- O vento apagou a minha luz. Será que você não sabe quem poderá acender minha lanterna? E o urso da floresta disse a ela que não sabia, que perguntasse a outro, pois estava com sono e ia dormir e repousar.

Surgiu então, uma raposa, caçando na floresta esgueirando-se entre o capim. Espantada, a raposa levantou seu focinho e, farejando, descobriu a menina. Indignada, a raposa dirigiu-se a ela e mandou que voltasse para casa porque a menina espantava os ratinhos.

Com tristeza, a menina percebeu que ninguém queria ajudá-la. Sentou-se numa pedra e chorou. Neste momento, surgiram estrelas que lhe disseram: - Pergunte ao sol, porque ele poderá ajudá-la. Depois de ouvir o conselho das estrelas, a menina criou coragem para continuar o seu caminho.

Finalmente, chegou a uma casinha, dentro da qual avistou uma mulher muito velha, sentada, fiando em sua roca. A menina abriu a porta, e cumprimentou a velha.
- Bom dia, querida vovó – disse ela. - Bom dia – respondeu a velha.
A menina perguntou se ela conhecia o caminho até o sol e se ela queria ir com ela, mas a velha disse que não podia acompanhá-la, porque ela fiava sem cessar e sua roca não poderia parar. Mas pediu à menina que descansasse um pouco, pois o caminho era muito longo. A menina entrou na casinha e sentou-se para descansar. Pouco depois, pegou sua lanterna e continuou a caminhada.

Mais para frente encontrou outra casinha no seu caminho, a casa do sapateiro. Ele estava sentado consertando muitos sapatos. A menina abriu a porta e cumprimentou-o. Perguntou, então, se ele conhecia o caminho do sol e se queria ir com ela procurá-lo. Ele disse que não podia acompanhá-la, pois tinha muitos sapatos para consertar. Deixou que ela descansasse um pouco, pois sabia que seu caminho era longo. A menina entrou e sentou-se para descansar. Depois que descansou, pegou a sua lanterna e continuou a caminhada.

Vem longe, avistou uma montanha muito alta. Com certeza, o sol mora lá em cima, – pensou a menina e pôs-se a correr, rápida com uma corsa. No meio do caminho, encontrou uma criança que brincava com uma bola. Chamou-a para que fosse com ela até o sol, mas a criança nem respondeu. Preferiu brincar com sua bola e afastou-se saltitando pelos campos.
Então, a menina da lanterna continuou sozinha o seu caminho. Foi subindo pela encosta da montanha. Quando chegou ao topo, não encontrou o sol.

-Vou esperar aqui, até o sol chegar – pensou a menina, e sentou-se na terra. Como estava muito cansada de sua longa caminhada, seus olhos se fecharam  e ela adormeceu. O sol já tinha avistado a menina há muito tempo. Quando chegou a noite, ele desceu até a menina e acendeu a sua lanterna.

Depois que o sol voltou para o céu, a menina acordou.

Oh! A minha lanterna está acesa! – exclamou e, com um salto, pôs-se alegremente a caminhar.

Na volta, reencontrou a criança da bola, que lhe disse ter perdido a bola, não conseguindo encontrá-la por causa do escuro. As duas crianças procuraram, então, a bola. Após encontrá-la, a criança afastou-se alegremente.

A menina da lanterna continuou o seu caminho até o vale e chegou à casa do sapateiro, que estava muito triste, na sua oficina. Quando viu a menina, disse-lhe que seu fogo tinha se apagado e suas mãos estavam frias, não podendo, portanto, trabalhar mais. A menina acendeu a lanterna do sapateiro, que agradeceu, aqueceu as mãos e pôde martelar e costurar os seus sapatos.
A menina continuou lentamente a sua caminhada pela floresta e chegou ao casebre da velha. Seu quartinho estava escuro. Sua luz tinha se consumido e ela não pôde mais fiar. A menina acendeu nova luz e a velha agradeceu, e logo sua roca girou sem parar, fiando, fiando, sem cansar.

Depois e algum tempo, a menina chegou ao campo e todos os animais acordaram com o brilho de sua lanterna. A raposinha, ofuscada farejou para descobrir de onde vinha tanta luz. O urso bocejou, grunhiu e tropeçando desajeitado, foi atrás da menina. O ouriço, muito curioso, aproximou-se dela e perguntou de onde vinha aquele vaga-lume gigante.
Assim, a menina voltou feliz para casa sempre cantando a sua canção.